terça-feira, junho 14, 2011

Rotulação e senso comum, a gente vê por aqui.

  • Sugiro que leia esse texto ouvindo a música Pagu, de Rita Lee e Zélia Duncan

Meu nome é Marina de Oliveira Pimentel, tenho 23 anos, sou jornalista, vou casar no final do ano com um homem também jornalista. Moro em Portugal há nove meses. Estou aqui porque sou mestranda da Universidade de Coimbra, uma das mais antigas e respeitadas da Europa. Sou mulher, BRASILEIRA e não, não sou uma vadia!

Decidi vir pra cá pela facilidade com a língua, a proximidadae cultural, por causa da fama da Faculdade e diga-se bem a verdade, porque mestrados no meu país ainda são muito caros.

Desde que cheguei a Portugal minhas impressões sobre este país são diversas e divergentes. Ora adoro, ora odeio. Isso se deve ao atraso econômico e cultural do país, das belas paisagens, do carinho com que fui tratada nesse tempo todo pelos portugueses e principalmente pelo preconceito para com os brasileiros, mas principalmente pelas brasileiras.

Ontem assisstindo um programa televisivo que faz sátiras ao Big Brother (O Último a Sair) a conversa dos participantes (atores e pessoas públicas de Portugal) era sobre a saída de uma moça, - a gostosa e burra - da casa. E lá pelas tantas uma participante disse que a tal nem se lembraria que tinha estado na casa devido à sua burrice. Outra participante emendou dizendo que a tal que havia saído era a "típica brasileira". Justificando-se em seguida: "faz o que quer".

Claramente as referências eram às brasileiras prostitutas e claro, ao rótulo que nós mulheres brasileiras temos mundo a fora. Nada mais do que vagabundas que saem do seu país para roubarem o marido das outras, mulheres honestas e donas de casa respeitáveis.

Ok, diante disso, deveria eu entrar no mérito do preconceito ignorante daqueles que escreveram o texto e ainda mais daquela (TAMBÉM MULHER) que concordou em reproduzir tamanha asneira ou "parvoíce" como muito se usa por aqui?

Será que devo combater preconceito com preconeito colocando aqui a imagem tosca de todas as nacionalidades que consigo imaginar agora? Devia eu reproduzir essa rotulação ridícula defendendo que nem toda brasileira é puta assim como nem toda portuguesa é bigoduda, nem toda colombiana é traficante, nem toda alemã é nazi e nem toda francesa é fedida?

Eu tenho plena conscinência de que a fama que temos dentro e fora do nosso país se deve exclusivamente a nós mesmos. São anos e anos de propaganda sexual, transformando bunda e peito em mercadoria pra gringo ver. Somos um bando de mulatas sambando com um cocar na cabeça e uma caipirinha na mão aguardando o próximo inglês chegar pra mostrarmos nossa "hospitalidade tupinambá".

Que fique claro, minha crítica aqui não é (diretamente) aos portugueses que tratam a brasileira como objeto. Mas a nós próprios que insistimos em vender essa imagem absurda de que: 1) no Brasil só tem verão, portanto andamos todas de biquini na rua e sim, você pode me comer a hora que você quiser, 2) somos um país "pra frentex" aqui tudo pode, chega mais que pra você também tem e se não tiver damos um jeitinho, 3) chegou janeiro, bora colocar a mulherada de tapa sexo no caldeirão do Huck porque é isso que é cultura, né não?!!!

Esse texto, em época de Marcha das Vadias e tantos preconceitos "políticamente incorretos" pode ser apenas mais um, ser um tema batido. Mas não, não admito mais ser tratada como piranha. E mais, ainda que fosse a mais piranha entre as piranhas ninguém tem o direito de apontar o dedo na minha cara e dizer como devo agir por ser dessa ou outra nacionalidade.

Chega de rotulação e senso comum, em português, brasileiro, inglês, espanhol, ou qualquer outra língua!

Um comentário:

Guta Brandt disse...

Querida "quase sócia":

Li, reli e li de novo cada palavra (e por mais que não pudesse estar escutando Pagú agora, nem preciso dizer que cada verso desta letra ecoou na minha cabeça enquanto lia. Afinal, estamos falando de Rita Lee e de Zélia Duncan :P).

Mas enfim, tietagem à parte, AMEI tudo que li. E entendo cada palavra, não apenas por ter morado fora também, mas, principalmente, por morar no Brasil. Neste país tão, mas tão mesmo, falsamente "pra frentex". Adorei isso: "2) somos um país "pra frentex" aqui tudo pode, chega mais que pra você também tem e se não tiver damos um jeitinho".

Na verdade, somos uma nação de hipócritas. O "país do Carnaval" é o país do preconceito. O país do machismo. Um país de "varões" - e acho horrível essa palavra, diga-se de passagem. O preconceito que as mulheres brasileiras sofrem e todos os lugares do mundo, nada mais é, do que a reprodução - fiel - do preconceito que sofremos aqui. E é, pra dizer o mínimo, lamentável.

Além de tudo isso, o que é ainda mais absurdo, é que não é apenas um preconceito de homens em direção às mulheres. Mas é um preconceito de mulheres contra mulheres. Pior do que um homem machista, é uma mulher machista. E, convenhamos, não são poucas por aí.

As mulheres têm preconceito com homens gays, têm preconceito com mulheres lésbicas, têm preconceito com mulheres "piranhas", com mulheres mais velhas, com meninas novas, com todo mundo. E é uma coisa tão forte, e tão, ao mesmo tempo, sutil, que vem mascarada de costumes, hábitos e "relações sociais", que acabamos por aceitar e absorver. É muito triste. Triste porque jamais nos verão de outra forma, enquanto muitas continuarem a reproduzir os mesmos velhos estereótipos. Vivemos, sem dúvida, um retrocesso. Ou será que todas aquelas que brigaram e deram suas caras à tapa tiveram um esforço emv vão? Será que nunca avançamos?

Bom mesmo seria que a realidade fosse vista como se "nem toda feiticeira é corcunda, nem toda brasileira é bunda", nem todo viado fosse menininha, nem toda lésbica fosse macho e, principalmente, nem toda mulher fosse um objeto...

Parabéns, Má!